Descobrindo Dundee: a Escócia além de Edimburgo
Não conheço quem tenha sonhado desde criancinha em visitar Dundee, na Escócia, mas sei que eu e Dom Pedro II já passamos por lá.
Dom Pedro II estava a caminho de Inverness e, embora eu não tenha encontrado nada que indicasse o motivo da viagem, a passagem dele está registrada num poema do escocês William McGonagall, gravado no calçadão às margens do rio Tay:
Beatiful Railway Bridge of the Silvery Tay!
That has caused the Emperor of Brazil to leave
His home far away, incognito in his dress,
And view thee ere he passed along en route to Inverness.
Eu não fui mencionada em versos dundeenianos, pelo menos não por enquanto, mas meus motivos para estar em Dundee foram muito nobres. Fui ver pessoas queridas que moram lá desde janeiro do ano passado, quando meu cunhado começou seu doutorado no James Huton Institut, em Invergowrie.
A cidade é interessante e orgulha-se de ter ficado famosa no Reino Unido por conta de seus “três jotas”: juta, geleia (que é com J em inglês) e jornalismo. Foi a indústria de juta que impulsionou o crescimento da cidade no século XIX. Era para ela ou em atividades relativas a ela que trabalhava a maioria dos habitantes de Dundee.
A geleia, que é mesmo uma delícia, dizem que foi inventada por Janet Keiller, que morava na cidade, em 1797. Os registros não comprovam a invenção, mas dão conta de que a moça foi responsável pela produção em larga escala e pela exportação da Keiller’s Marmalade, que ficou mundialmente conhecida.
Com a fundação da DC Thomson & Co. em 1905, Dundee virou referência também no jornalismo. A empresa publicava quadrinhos, jornais e revistas, entre eles The Sunday Post e The Courier. A forte tradição em cartoons fez com que Desperate Dan, um dos personagens mais famosos localmente, virasse estátua no centro da cidade.
Visitando a galeria MacManus, principal museu da cidade, descobri outros marcos do jornalismo que aconteceram ali. Foi de Dundee que saíram, em 1894, as duas primeiras mulheres correspondentes internacionais. Marie Imandt e Bessie Maxwell visitaram 10 países, numa viagem de mais de 200 dias, com a missão de contar para a população britânica como viviam as mulheres mundo afora. Sem dúvida um empreendimento audacioso, que foi um sucesso e virou um livro, chamado Two Intrepid Ladies.
A construção naval também foi um destaque no desenvolvimento da cidade. Em dez anos, no final do século 19, a cidade construiu 200 navios. Entre eles, o RRS Discovery, que foi o primeiro a partir para uma expedição na Antártida. Hoje, o navio pode ser visitado em uma exposição muito bem montada e interessante.
A maior tragédia da história de Dundee aconteceu em 1879, quando a primeira ponte ferroviária que cruzava o rio Tay desmoronou em uma tempestade, matando 75 pessoas. A lembrança do desastre ainda comove a população. Essa é a mesma Tay Bridge do poema de William McGonagall, citado lá no começo deste post.
Aliás, falando em desgraça e a título de curiosidade, McGonagall acabou considerado o pior poeta de todos os tempos – e isso também virou livro :)
Dundee tem sua origem no século 12. Hoje, a cidade – onde vivem pouco mais de 150 mil pessoas – está se reinventando, revitalizando a região portuária e investindo na indústria criativa para se transformar numa das capitais mundiais do design. Não sei se Dom Pedro teria motivos para torcer pelo sucesso de Dundee, mas eu com certeza tenho e já comprei até a camisa do time de futebol de lá.