Street art em Londres: workshop de graffiti em Shoreditch
Para quem não conhece o East End de Londres, aquele não é um endereço muito fácil achar. Se não fosse uma plaquinha na calçada, você não entraria por aquela cerca de madeira e não descobriria que aquele pátio tem verdadeiras obras de arte entre painéis de madeira e tonéis de metal.
O workshop de grafite que a gente fez em Londres aconteceu nos fundos do Red Market, um lugar que durante o dia você não dá nada, mas à noite ganha vida com as barraquinhas de comida do evento Night Tales.
Quem recebeu a gente foi o Keir, do Alternative LDN, formado em Belas Artes e apaixonado por arte urbana.
O dia começou com um tour para conhecer a cena de street art em Londres. Fizemos um circuito pelas ruas do East End para ver os murais e instalações que surgem por todos os lados.
Claro que você pode encontrar mapas e listas para fazer itinerários por conta própria, mas fazer um passeio guiado por um cara que é grafiteiro e que conhece boa parte dos artistas que trabalham no UK é completamente diferente.
Kier ia comentando as diversas técnicas usadas em cada mural e a gente começava a entender melhor o estilo e a proposta de cada artista. Ele contava inclusive a história por trás dos grafites, mostrava como um conversava com o outro, falava sobre a reação da polícia e dos moradores do bairro. Um passeio interessantíssimo!
Grafites de Banksy são só o começo
Os primeiros 15 minutos de tour já não decepcionam – o roteiro começa de cara com dois dos maiores nomes da street art britânica: Stik e Banksy.
Mas a partir daí, muito além dos grafites, Kier começou a chamar nossa atenção para outros tipos de arte, como as instalações de cogumelos do Mushroom Man ou as caretas do artista francês Gregos, que ficou famoso por espalhar suas máscaras pelo mundo.
Algumas intervenções são particularmente curiosas, como as cenas pintadas em miniatura pelo artista conhecido como Chewing Gum Man, que usa como tela os chicletes grudados no chão e nas paredes da cidade.
O francês Space Invader também já passou por essa área de Londres e ganhou até plaquinha do Street Museum of Art, como aquelas de museu!
Mas é na Hewett Street que encontramos as duas obras com as técnicas mais incríveis que vimos no passeio.
A primeira é o cowboy do El Mac, um artista de Los Angeles que congela as latinhas de grafite para reduzir a pressão do spray e faz linhas contínuas e geometricamente alinhadas para formar desenhos incríveis. A luz e as sombras são perfeitas!
A outra é o retrato feito pelo artista português Vhils – que, em vez de usar tinta, lasca pedacinhos da parede para fazer seus desenhos.
Essa espécie de gravura às avessas virou a marca registrada dele, mas a técnica aplicada varia bastante de um mural para o outro, usando qualquer coisa entre uma britadeira, uma picareta ou até explosivos (!!!) para esburacar as paredes.
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Eu já tinha visto foto de trabalhos do Vhils, mas é outra coisa poder olhar de perto e sentir a textura.
Se não fosse fugaz, não seria street art
Levei um susto quando Kier contou que naquele quarteirão da Hewett Street será construído um condomínio de luxo. Isso quer dizer que as obras do Vhils e El Mac serão destruídas em breve :/
“Será que não tem jeito de salvar os murais?”, perguntou uma das meninas do nosso tour. “Espero que não”, respondeu o guia. A arte de rua é efêmera por natureza – e para Kier isso é parte da beleza da coisa.
Essa é a diferença de fazer um passeio desses com quem realmente entende a lógica da arte urbana: ele não vê vantagem nenhuma em preservar um graffiti fora do contexto em que ele foi criado, impedindo a arte de dialogar com a cidade e às vezes servindo para lucro privado de alguém que se apropriou daquele mural e depois vendeu sem que o artista ganhasse 1 centavo sequer.
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Um dos grafites que a gente viu representa era um stencil do Banksy que dizia “This wall is a designated graffiti area”, com todo jeito de aviso oficial. Não era a primeira vez que Banksy pintava isso e, ao reconhecer a autoria da peça, o dono do lugar logo emoldurou a parede, protegendo o grafite sob um vidro.
O outro muro que tinha ganhado esse mesmo stencil teve um destino bem diferente. Numa cidade onde a polícia é super intolerante com pichações, a criação de uma “área permitida” fez com que o lugar se tornasse uma festa – em menos de 48 horas aquela parede estava coberta de desenhos e tags!
O grafite de Banksy parecia tão oficial que enganou a própria polícia, que levou um tempo até perceber que era pegadinha e apagar tudo.
Mas ali em Shoreditch a provocação de Banksy protegida com vidro não teve o mesmo efeito. Ainda estava lá, ao contrário da primeira, mas estava sozinha. E por isso Kier defendia que preservar a arte de rua também significa limitá-la.
Quando chega a hora do almoço, você já está craque em encontrar arte de rua por todos os cantos e faz suas próprias descobertas enquanto procura um lugar legal para comer.
Eu e Guilherme comemos no Attendant, um café que tem croissants, sanduíches, suco de laranja feito na hora e um cupcake de Oreo que é tão gostoso quanto promete.
Workshop de grafite em Londres
À tarde é a nossa vez de grafitar. O ônibus double decker que estava dentro do Red Market serviu de atelier para desenhar e cortar nossos stencils. Para cada camada de cor, é preciso fazer um molde diferente – e daí você vai pintando um por cima do outro até formar o desenho completo.
Fiz um desenho bem simples, um balãozinho com duas camadas apenas, enquanto o Guilherme fez um conceito bem mais complexo, mas que foi super divertido de montar!
Experimentamos um pouco com as latinhas de spray, para aprender a usar os diferentes tipos de caps, e fomos grafitar :D
Não pintamos paredes, só o próprio ônibus e os painéis de madeira no pátio, mas aquele mural assinado pelo Phlegm bem em cima da gente fazia a experiência parecer bastante real!
Foi um dia super divertido. É um programão para quem curte arte e quer fugir do óbvio em Londres. O passeio guiado e o workshop da Alternative LDN duraram 4 horas (das 11h às 15h), mas eles também têm tours mais curtos e circuitos de bicicleta.
Quem quer conhecer esse colorido “lado B” de Londres também pode dar uma olhada em outras empresas como a Shoreditch Street Art Tours e a London Graffiti Tours, além da Free Tours by Foot, que tem passeios walking tour naquele esquema de gorjeta.
O East End de Londres virou um dos maiores polos de arte urbana do mundo e se tornou um ponto de encontro para artistas dos quatro cantos. Ali a gente encontra murais de grafiteiros franceses, brasileiros, irlandeses, americanos, belgas… Há sempre tinta fresca em Shoreditch e dois passeios por aquelas ruas nunca são iguais.