Lugar de la Memoria: o museu mais emocionante de Lima
O Lugar de la Memoria, la Tolerancia y la Inclusión Social é o mais surpreendente dos museus de Lima, capital do Peru. E o mais emocionante também! Inaugurado no fim de 2015, o museu discute questões de direitos humanos, com foco no período de violência vivido pelo Peru entre 1980 e 2000, com os conflitos dos grupos terroristas Sendero Luminoso e Movimiento Revolucionario Túpac Amaru (MRTA) com o estado peruano.
Os conflitos tiveram fortes consequências na sociedade e na economia, e é impressionante ver como o museu aborda a história recente do país de forma bastante aberta e crítica. A história é contada com recursos interativos, depoimentos em vídeo e instalações que combinam pesquisa histórica e arte. É uma exposição forte, mas interessantíssima de visitar.
Sendero Luminoso e os conflitos no Peru
O Sendero Luminoso foi um movimento político peruano que, nos anos 80, deu guinada radical e partiu para a luta armada. Se tornou um dos maiores grupos de ação da América do Sul, ao lado das FARC da Colômbia. O grupo esperava inspirar as massas a se levantarem e iniciarem revoluções para derrubar os sistemas políticos e econômicos existentes.
Na prática, a adoção de ações violentas e autoritárias dificultou a conciliação política de seus ideais e, eventualmente, fez o grupo cair em contradição com os princípios que defendia originalmente.
Os ataques contra o estado foram agravados pelo surgimento de outro grupo, o Movimiento Revolucionario Túpac Amaru (MRTA). Embora compartilhassem algumas semelhanças, os dois grupos guerrearam entre si, o que agravou a tensão no país.
O governo peruano, por sua vez, cometeu erros estratégicos para responder aos atos de terrorismo – primeiro subestimando seu risco e depois desencadeando o aumento da violência. O exército empreendeu uma sangrenta série de represálias, com atuação dos Sinchis (unidade especial da Polícia Nacional do Peru treinada e financiada pelos Boinas Verdes dos EUA) e também dos Ronderos (grupos de camponeses que se armaram em auto defesa).
Diante desse cenário extremamente complexo, o Peru se afundou em crise econômica e a população sofreu terrivelmente com a violência. Entre 1980 e 2000, cerca de 70 mil pessoas morreram em decorrência dos conflitos, segundo dados da Comisión de la Verdad y Reconciliación.
A exposição do Lugar de la Memoria
Eu tinha uma lembrança muito vaga do tema nos noticiários, então a contextualização do cenário político no início da exposição foi realmente importante para mim. O primeiro andar do Lugar de la Memoria mostra a origem de cada um dos grupos envolvidos e segue a linha do tempo ilustrando os principais ataques e acontecimentos do período.
Uma das instalações mais emocionantes da exposição é a sala com vídeos de depoimentos de pessoas que tiveram suas vidas afetadas pelos conflitos. É interessante como o museu traz uma diversidade de vozes, e como os relatos pessoais trazem outra dimensão para os fatos históricos.
O segundo andar introduz um novo aspecto na discussão: o papel do ativismo social. Muito mais que exércitos e movimentos revolucionários, agora nós vemos a sociedade se mobilizando em protestos pacifistas, pedindo o fim dos conflitos. Igrejas e associações de parentes das vítimas também tiveram uma atuação importante, reunindo esforços para combater os efeitos da guerra, oferecer auxílio às vítimas e exigir justiça.
A exposição chega aos dias atuais (inclui acontecimentos de 2018!), refletindo sobre os desdobramentos da história, as investigações ainda em andamento – em particular sobre as vítimas desaparecidas – e debate também temas que continuam se fazendo urgentes, como a violência contra a mulher.
Missão de estabelecer o diálogo
Tratar de temas tão sensíveis, especialmente quando os acontecimentos históricos ainda são recentes, não é uma missão fácil. Achei muito interessante saber que a comissão que criou o museu adotou um processo participativo que contou com representantes de organizações civis e estatuais, associações de parentes das vítimas, além de ter realizados grupos focais em escolas do país.
O Lugar de la Memória é o resultado de uma enorme pesquisa documental e audiovisual que segue alimentando estudos sobre questões relacionadas aos direitos humanos.
O escritor peruano Mario Vargas Llosa, ganhador do Prêmio Nobel, atuou como jornalista na cobertura dos conflitos, participou de investigações e contribuiu também para o projeto do museu. Há um depoimento dele em vídeo logo em uma das primeiras salas, vale a pena ver.
Arquitetura do Lugar de la Memoria
A arquitetura do Lugar de la Memória também chama a atenção de quem visita. A construção foi feita nas falésias de Miraflores, de frente para o Oceano Pacífico. É lindo como as cores naturais da rocha e as linhas retas do projeto contrastam com a vista para o mar.
No nível mais alto, onde há um terraço com vista panorâmica, alguns murais de arte e uma instalação com a Declaração Universal dos Direitos Humanos – que ganha outro nível de impacto ao ser lida depois de ver a exposição.
O projeto arquitetônico foi nas bienais de arquitetura de Buenos Aires e do Peru, além de ganhar o troféu Niemeyer na Bienal Pan Americana de 2016.
Como visitar o Lugar de la Memória, em Lima
O Lugar de la Memória tem ingresso gratuito, basta preencher a lista de visitantes na entrada. O horário de funcionamento é de 10h às 18h, de terça a domingo. Não abre às segundas.
O museu fica na encosta de Miraflores. O melhor jeito de chegar no Lugar de la Memória é mesmo de Uber – são cerca de 10 minutos desde o Shopping Larcomar, a corrida fica em torno de 10 soles. Se você estiver a pé, o acesso pelo Circuito das Playas pode ser difícil, mas é possível acessar o museu pela Avenida del Ejército. Veja outras ideias de passeios e o que fazer em Miraflores.